Carreta da Saúde e outras unidades móveis
Quando estava no 2º ano da faculdade de medicina, na Universidade Estadual de Londrina (UEL), no Paraná, em 1988, o paulistano Roberto Kikawa, de 42 anos, recebeu um pedido de seu pai, que lutava contra um câncer terminal. “Quero que você prometa que vai se formar e se tornar um médico mais humano”, disse ele, pouco antes de morrer. A frase jamais saiu da cabeça de Kikawa.
Uma bolsa de estudos garantiu a conclusão da faculdade, e ele passou a gastar boa parte do seu tempo concebendo formas de atender a população de baixa renda. Em 2005, criou um protótipo de caminhão adaptado para levar exames diagnósticos às pessoas que aguardavam meses por eles na fila do SUS. Viajou até a sede de um dos gigantes do setor de tecnologia em saúde, a Olympus, nos Estados Unidos, para pedir dinheiro. Conseguiu 500.000 dólares em equipamentos de última geração. “Saí de lá pulando de alegria, mas ainda me faltava o carro”, conta. Bateu à porta de quarenta possíveis doadores, entre executivos, empresários, médicos e associações. De vinte deles ouviu um “sim” e juntou 500.000 reais para a compra da carreta. O negócio ficou pronto em 2009. Nascia assim o projeto Cies (Centro de Integração de Educação e Saúde).
Nos últimos anos, o caminhão ganhou a companhia de outras duas invenções. A van da saúde foi planejada para chegar a vielas de difícil acesso em favelas. Já o boxe da saúde, que pode se deslocar em guincho, trem e balsa, certa vez foi convocado para atuar contra a má nutrição na Favela Pantanal, na Zona Leste. A frota atendeu mais de 4.000 pacientes na capital, em diversos bairros da periferia. Antes do trabalho, o Cies avisa à subprefeitura local onde vai estacionar e pede a ela que agende as consultas de acordo com a lista de espera. Na carreta, o paciente é atendido e passa por exames médicos de média complexidade em dez especialidades, como endoscopia, mamografia, ultrassonografia e até pequenas cirurgias, como a de catarata. Se necessário, ele é encaminhado a hospitais parceiros. Os procedimentos gratuitos duram quinze minutos e são realizados por 82 médicos remunerados — o único voluntário na empresa é o próprio Kikawa, que ganha a vida como diretor clínico do Hospital São Camilo e em seus dois consultórios de gastroenterologia.
Com um orçamento anual de 3,7 milhões de reais, o Cies caminha com a ajuda de doações de empresas como o próprio São Camilo. O modelo, que atraiu a atenção de universidades como a de Munique, na Alemanha, e a de Princeton, nos Estados Unidos, ganhou quatro prêmios de empreendedorismo social desde a sua criação. Mas Kikawa ainda não se deu por satisfeito. Quer melhorar seu banco de dados para detectar e prevenir doenças e desenvolver um projeto com pacientes terminais. Sonha ainda tornar a formação médica mais humanizada, como lhe pediu seu pai. “O profissional hoje não quer mais tocar no paciente para diagnosticá-lo”, diz ele. “É preciso mudar isso.